O Difícil Parto da Mia

O Difícil Parto da Mia

o dificil parto da mia (3)Dia 10 de Março, com 41 semanas e 5 dias era a minha data limite para entrar em trabalho de parto. Eu já tinha tentado de tudo para induzir naturalmente: acupuntura, caminhadas, pular na bola, sexo… Óleo de rícino (muita gente não tem coragem de usar)! Descolamento de membranas 2 dias antes e nada dela querer nascer.

Eu me sentia triste e conformada. Não tinha problemas de ir para cesárea caso precisasse, mas eu queria sentir o gostinho de estar em trabalho de parto, afinal me preparei tanto para esse momento.

Do dia 9 de março para o dia 10 eu não dormi. Fiquei boas horas na madruga deitada na cama do meu filho beijando e dando carinho, afinal quem faz cesárea tem que ficar 5 dias no hospital e eu nunca tinha ficado 24 horas longe dele até então.

Eles iam me oferecer romper a minha bolsa mas depois de muito pesquisar e ver que só o rompimento não faz entrar em trabalho de parto. O rompimento artificial de bolsa precisa ser associado com gel de prostaglandinas ou ocitocina sintética para funcionar. E por causa da cesárea prévia não podiam usar nada disso.

Ter VBAC limita demais em certos aspectos.

Então dia 10 de Março, de manhã bem cedo, fui para o Hospital para rejeitar o rompimento de bolsa e ir para cesárea.

Fui para o hospital como se estivesse indo para um enterro. Eu queria demais sentir as contrações verdadeiras, sentir a famosa dor do parto. Será que dói mesmo? Será que é uma dor insuportável como dizem ser? Será que tudo o que estudei iria me ajudar, como controlar o cérebro?

Eu nunca ia saber.

Paramos no estacionamento do hospital e quando eu saí senti algo quente escorrendo pelas pernas. “Poxa vida, a situação ta tão ruim que não consigo mais segurar o xixi” pensei “Ainda bem que isso vai acabar hoje”.

No fundo eu desconfiei que não era xixi. Me encontrei com a minha doula, Germaine, no hall do hospital e fomos para o banheiro. Contei para ela e ela ficou empolgada  “É a bolsa”. Subimos para as salas de parto e lá o obstetra olhou e confirmou “Sim, foi a bolsa que estourou”.

Quem diria que o rumo das coisas iria mudar no estacionamento do hospital. Na cara do gol. Que a minha bolsa romperia bem ali.

Mas as contrações não começaram, como eu temi.. Também notei um líquido levemente esverdeado saindo junto “É mecônio” pensei. Não me desesperei porque já tinha estudado sobre mecônio e sabia que o fato de ter mecônio sozinho não significa nada. O único problema do mecônio seria se fosse parar nos pulmões do bebê, ou seja, se ele aspirasse. A enfermeira obstétrica que me acompanhava  disse que teríamos que monitorar os batimentos cardíacos do bebê de perto por causa do mecônio. Aqui quem ajuda no parto são enfermeiras, o médico só entra se algo grave acontece.

Para me fazer entrar em trabalho de parto, a minha doula me colocou para caminhar pelo hospital, subir e descer escadas e fazer uns exercícios estranhos.

Se eu não entrasse em trabalho de parto nada adiantaria. Eu iria para a césarea de qualquer forma. Mas 1h depois da bolsa romper as contrações começaram. Elas vinham em ondas. Umas mais fracas, outras mais fortes, mas com um intervalo de 15/20 minutos entre elas.

Nesse meio tempo o marido tinha ido em casa pegar a minha bola de pilates, o tapete de yoga, o meu TENS e a bolsa de ervas para usar morna. Eu estava munida com todo arsenal para analgesia natural.

Comecei usando o TENS. Apesar de que as dores eram na frente, na barriga, e o TENS ficar nas costas, ajudou um pouco. Eu me movia livremente para lá e para cá dento da sala de parto que era bem espaçosa. Nisso a minha doula me ajudava a fazer umas posições para o bebê descer. Às vezes eu mesma sentia vontade de fazer algumas outras posições e mais tarde o meu marido disse que tanto a minha doula quanto a enfermeira que me acompanhava ficavam admiradas como eu sabia o que estava fazendo. Mas eu estava somente obedecendo ao meu corpo.

Depois de 8 horas de trabalho de parto eu pedi para a enfermeira verificar a dilatação. Ela me negou. Disse que estava no meu plano de parto que eu queria que verificasse o mínimo possível e que às 9PM o turno mudaria e seria outra enfermeira me acompanhando madrugada afora, então seria melhor que ela verificasse a minha dilatação que o ideal seria que a mesma pessoa fizesse as medições. Assim me prometeu que às 21hs eu saberia a minha dilatação. Concordei.

A certa altura o TENS parou de fazer efeito então pedi para que tirassem e me desse o gás de entonox. A enfermeira Orla, que me acompanhou de manhã e de tarde, me deu o gás e disse “esse gás não faz efeito nas Irlandesas, mas é capaz de fazer em você”. Eu coloquei um tubo na boca e assim que a contração começava eu sugava fundo e segurava, soltava e voltava a sugar fundo e segurava. O efeito do gás veio e eu me sentia levemente bêbada. Senti fome e sede. Comi e bebi uma bebida energética estilo gatorade. Continuei me movimentando e fazendo exercícios para a descida do bebê, orientada pela minha doula. Eu não sentia mais as dores das contrações, mas sentia as contrações direitinho: vinham em ondas – começavam fracas e iam ficando mais fortes, aí atingiam um pico e voltavam a enfraquecer. Algumas contrações eram mais fortes que as outras. A enfermeira me disse que o lindo do parto natural, sem indução, é que as contrações variam de intensidade, fazendo com que a mulher suporte melhor a dor.

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Eu usando o gás de etanox e a bola de pilates ao mesmo tempo.

Eu estava tão feliz usando esse gás maravilhoso que abracei todo mundo e chorava de emoção por estar em trabalho de parto. Tudo lindo e maravilhoso como eu sempre sonhei. Olhei a minha doula nos olhos e disse que estava muito feliz de poder estar sentindo aquilo tudo. “Como as mulheres fazem sem esse gás no Brasil?” – pensei.

O turno trocou e a enfermeira Orla me disse que sairia. Eu pedi para que ela me desse a melhor enfermeira que estivesse entrando naquele turno. E assim ela fez. Stefany foi a escolhida por Orla e era uma enfermeira super experiente. Maravilhosa por sinal. Assim que ela entrou, as 21hs, me fez o primeiro toque e para a minha decepção eu tinha dilatado apenas 1cm. Nesse momento o meu mundo caiu. “Como assim eu tô aqui desde de manhã e são 21hs e até agora só dilatei 1cm? Poxa vida”. Mas a minha batalha continuou.

Chegou a hora de usar o chuveiro, água quente, como analgesia. Não sei se foi sugestão da minha doula ou da enfermeira. Fui para debaixo do chuveiro com o meu marido. Levei o gás junto e continuei usando. Recebi um banquinho com um buraco no meio para sentar. Só de olhar para o banquinho eu reconheci. “Ah, é o banco que usam para conseguir parir o bebê nessa posição ereta”. Sentei nele e fiquei embaixo do chuveiro junto com o meu marido. Aquela água quente que corria pelo corpo abaixo ajudou muito a relaxar. Nesse momento as contrações estavam mais fortes e o espaço entre elas era de 3 a 5 minutos. “Ah, agora devo ter dilatado bem mais”. Fiquei 1h e 40 embaixo do chuveiro e saímos.

A minha saga continuou fora do chuveiro. Muitos exercícios, muitos movimentos, em certos momentos que as dores vinham eu me jogava nos braços do meu marido e me agachava. Ele segurava todo o peso do meu corpo quando isso acontecia.

Logo em seguida comecei a ter febre… 38… 39 graus. Tomei paracetamol e também usaram um ventilador para controlar a temperatura. Comecei a viajar, alucinar. Em alguns momentos eu me via numa floresta, dentro de um rio, me banhando numa cachoeira. Estava só eu ali, no silêncio da mata, ouvindo o barulho dos pássaros… e parindo. Parindo ali no meio do mato e sozinha. Super grávida e rebolativa. Eu não via mais ninguém à minha volta. Nesse momento eu não era mais capaz de falar inglês com a minha doula e nem com a enfermeira. Meu marido tinha que traduzir tudo o que eu falava, ele me disse. A minha doula passou a entender o português: quando eu pedia água ou ajuda para levar o gás para o banheiro para fazer xixi (tinha que trocar a saída do gás quando eu ia para o banheiro).

Depois de um tempo com febre veio o resultado do exame de sangue: eu estava com infecção. Na verdade eu já estava tomando antibiótico por causa da bolsa rota.

As dores começaram a ficar tão insuportáveis que eu comecei a implorar por anestesia. Me negaram, como estava no meu plano de parto. Só depois de 2 horas implorando me deram a epidural. Depois que me aplicaram a epidural, eu pude dormir por 1h. Quando acordei não sentia mais as minhas pernas, o que me deixou muito agoniada. Eu queria andar, eu queria me mexer, mas eu estava presa numa cama. Eu já me sentia melhor e queria continuar com o meu trabalho, mas eu não podia mais. Depois da epidural as contrações também diminuíram e não podiam me dar nada para acelerar as contrações, como ocitocina por exemplo. Por ser VBAC eles não podiam me oferecer essa opção.

Nesse momento o médico obstetra, que tudo acompanhava de longe, disse que queria a minha filha fora da minha barriga o mais rápido possível porque teria que tratar a infecção dela. Queria que eu fosse para cesárea.

A enfermeira obstetra, me disse que se eu quisesse eu poderia esperar mais 4 horas e tomar a última dose do antibiótico e assim a Mia estaria protegida da infecção. Mas o obstetra não me deixou fazer assim, resolveu me mandar para a cesárea afinal eu tinha uma infecção no sangue, que provavelmente já tinha passado para o bebê e o meu quadro não evoluía: eu não estava mais dilatando.

Quando fui para a cesárea eu estava chegando no meu limite. Além da febre e da infecção, que acho que foram responsáveis por delírios que eu senti no trabalho de parto, as dores também não ajudaram. As dores alternaram muito rapidamente barriga-costas, barriga-costas, barriga-costas. Era a Mia tentando virar para poder encaixar e nascer. Ela não estava conseguindo virar e eu além do cansaço físico (de não ter dormido e das longas horas de trabalho de parto) e da infecção, comecei a não suportar mais a dor.

Foram quase 24 horas de trabalho de parto e foi incrível. Doeeeeeeu pra cacete, mas foi a melhor sensação do mundo. Eu dizia para a minha doula o quanto eu estava feliz daquilo estar acontecendo comigo e por eu poder sentir toda essa emoção.

Realmente tudo o que eu estudei ajudou. Saber lidar com a dor faz toda a diferença MESMO, sem brincadeira.

Mia nasceu, ficou 5 minutos no meu colo e logo foi levada para a UTI começar os antibióticos e ser monitorada. Só fui amamentar a minha filha e fazer um “pele a pele” 2hs depois dela ter nascido. Mas tudo bem, o importante é que ela está viva e bem.

Acabamos as duas ficando 12 dias no hospital. Baby Mia em uma unidade especial tomando antibióticos e sendo monitorada por aparelhos e eu no soro e sem poder comer, pois tive, além da infecção, um abcesso fora do útero que poderia ter me rendido um final bem triste, mas ainda bem que deu tudo certo. Eu tive que continuar o meu tratamento em casa, voltando sempre ao hospital para novos exames. Esse tratamento durou mais de um mês.

Não curti a minha lua de leite. Passei o meu baby blues no hospital. Fiquei muito tempo afastada do meu filho.

Tudo foi bem sacrificante para mim.

Mas apesar de todo esse trauma (eu queria 5 filhos, mas vou ficar com 2 somente), apesar de toda dor de cabeça, hoje estamos bem e é isso que importa.

Mia nasceu de cesárea de emergência no dia 11 de Março de 2016 às 7:52, após quase 24hs de trabalho de parto, pesando 3,500kg com 47cm.  Tudo o que vivenciei nessas 24 horas foi incrível e faria tudo de novo (menos a parte de não ter dormido na noite anterior). No balanço final eu me sinto realizada.

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Mia tomando o seu primeiro mamazinho.

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