Bullying e Cyberbullying Pelo Olhar de Uma Psicopedagoga

Bullying e Cyberbullying Pelo Olhar de Uma Psicopedagoga

Por Juliana Brum, Psicopedagoga e Educadora

Durante anos trabalhando em escolas, da rede pública e privada, tradicionais ou não, observo o bullying como tema frequente. Ele aparece como uma das grandes preocupações das famílias e educadores, além de ser uma das causas para diversas questões que impactam profundamente crianças e adolescentes pelo mundo.

O bullying (entendido aqui como o conjunto de práticas violentas, abusivas e perversas que ultrapassam os limites do respeito ao outro) não é recente. É humano, cultural e, ao longo da história convivemos com ele e com as suas consequências. Todavia, nas últimas décadas temos nos voltado para esta questão de forma mais atenta, uma vez que as ocorrências do bullyng são cada vez mais divulgadas e, em alguns casos, associadas a situações com desfecho trágico como suicídios e assassinatos. Outra problemática crescente está associada à prática do cyberbullying (ou bullying virtual) que ultrapassa o espaço escolar, contribuindo para danos ainda mais graves, como a propagação de discursos de ódio, discriminações de toda sorte com efeitos de grandes proporções.

Não há dúvidas de que nós adultos estamos mobilizados em direção a compreender e combater estas práticas tão nocivas. Contudo, nos cabe também olhar a questão com maior profundidade e isto envolve falar de pessoas (e com elas), falar de nós, abrindo espaços para singularidades e subjetividades. O sofrimento é uma marca presente nas situações de bullying. A pessoa agredida carrega as marcas físicas e emocionais que permeiam toda a sua vida, interferindo nas suas escolhas, aprendizagens e na forma que se relaciona com o mundo. O “agressor”, por sua vez, também encontra-se em sofrimento, ainda que isto possa não ser evidenciado num olhar superficial.

Entendendo também o bullying como algo que nos acompanha por toda a vida, sabemos que ele não estará restrito à escola e nem mesmo aos grupos de crianças e adolescentes. Nesse sentido, precisamos atribuir a este conjunto de práticas os nomes que elas de fato têm: abuso, discriminação, racismo e toda a sorte de violências a elas associadas.

 

É importante entendermos que vivemos em uma sociedade que nos educa para a exclusão, para o individualismo. O respeito às diferenças e a prática da convivência na discordância não nos é ensinado. Não nos parece estranho, por exemplo, que uma criança dê tanta importância para o tênis X ou Y? Para a mochila Y ou Z? Como constroem esses padrões e referências? Por que se acham no direito de julgar um outro pelos mesmos padrões? O que faz um grupo de crianças excluir alguém pelo que veste, fala ou por qualquer característica? Nós enquanto adultos, nesta sociedade, temos dado conta de agir diferente? Temos promovido ambientes de inclusão, respeito e empatia? Nossas crianças não são educadas pelo que dizemos ou “ensinamos” a elas. São educadas pelas nossas práticas, ações e sentimentos. Pelo que veem, ouvem ou captam das entrelinhas.

Este cenário não é nenhuma novidade e, nós adultos educadores, já nos ocupamos de pensar estratégias que nos levem a boas práticas baseadas na não violência e empatia. Porém estamos tentando começar a resolver a questão pelo final, digamos assim. Estamos combatendo sintomas e não as causas. Queremos, com toda nossa boa intenção, transformar práticas sem compreendermos a origem delas. Queremos transformar as ações dos agressores sem entender (e trabalhar) o que os faz agredir. Queremos que as vítimas aprendam a se defender ou curem-se das suas feridas sem alcançarmos as razões da sua vulnerabilidade.

Ainda estamos olhando ações e não pessoas. Olhar pessoas passa por abrir espaços para que cada um de nós se manifeste genuinamente e que sejamos respeitados por isto, desde que nascemos. Quanto antes nos for garantido e visibilizado este espaço de respeito, antes aprenderemos que devemos garanti-lo também ao outro. Bem simplificadamente, pode estar aí uma das sementes da tão desejada empatia. Porém, ao invés de combatermos padrões, ainda estamos combatendo pessoas. Combatemos crianças!

Estamos inseridos numa cultura que treina o nosso olhar, desde a infância, para fora de nós, para o outro e seu julgamento. Este “outro” por sua vez também é vítima e sofre em maior ou menor proporção. A cultura da exclusão está pautada no sofrimento, alimenta-se dele que, por sua vez, torna-se causa e consequência das práticas de bullying ou outras violências.

Falamos tanto em empatia, mas pouco temos conseguido contribuir para que as crianças cuidem delas mesmas, ouçam seus próprios desejos, anseios, angústias e dores, antes de olhar o outro. A educação para o olhar respeitoso e acolhedor a nós mesmos é alimento para a autoestima e pode ser o início da trilha em direção à construção do respeito e cuidado com o outro.

 

Juliana Brum, Psicopedagoga e Consultora em Educação.
Atendimento a crianças, famílias, educadores, escolas e iniciativas parentais de educação em grupo ou individualmente. Co-fundadora do Movimento BrincaCidade. Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, RJ.
e-mail juliana.brum2@gmail.com
Tel: (21)98843-9377
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Facebook Movimento BrincaCidade
Website Movimento BrincaCidade

 

 

 

 

 

Referências:
FERNANDEZ, Alicia. A Atenção Aprisionada: psicopedagogia da capacidade atencional/ Alicia Fernandez; tradução técnica: Neusa Hickel, Regina Orgler Sordi. Porto Alegre: Penso, 2012.

SILVA, Ana Beatriz Barbosa em http://draanabeatriz.com.br/?p=638 . Acesso em 10 de outubro de 2017.

Leia mais em: Nova Escola: 21 perguntas e respostas sobre bullyng. https://novaescola.org.br/conteudo/336/bullying-escola . Acesso em 10 de outubro de 2017.

Imagem (tirinha Armandinho) retirada de https://goo.gl/images/s1VPht .

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